sábado, 19 de setembro de 2009

Autobiografia - Já que é obrigatória...

PRELÚDIO AMOROSO

Dizem que nasci por teimosia…não minha, da minha Mãe. Mas já então os amores estavam desencontrados!

Amores de aldeia perdida onde acaba o País e o outro que dizem irmão começa.
Amores de juventude, proíbidos e escondidos , beijos roubados e carícias ousadas debaixo das estrelas do que alguns teimam ser um dos céus mais bonitos do mundo, pela quantidade imensa de pontos luminosos que se deixam ver na escuridão de ruas e ruelas onde, ainda hoje, em algumas casas a electricidade se faz esperar .

Ela quis, ele não, ela é teimosa ainda hoje, ele também...ainda hoje!



Partiram rumo aos céus da capital onde as estrelas não têm espaço para brilhar, onde os deslumbramentos se faziam de estrelas, mas de cinema, e ele...deixou-se ir!
Ela ficou, mas não sózinha, por teimosia e porque achava que um filho lhe daria mais que todos os filmes da cidade, deixou-se ficar com uma barriga que ele desprezou tanto ou mais que a ela, provinciana que

Filipe da Veiga Ventura Alves
Galeria Pública Paisagem Natural

adormecia na sala do cinema.

EU E A MINHA MÃE

12 de Julho de 1962

Lisboa, Freguesia da Graça, quinta feira de Verão, madrugada, só por causa das coisas decidi que haveria de chegar entre o pôr das estrelas e o nascer do sol...pareceu-me bem então.

Parece que andei em “bolandas” de Lisboa para o Porto, daí para a Amadora e finalmente para a aldeia.

A Mãe ficou-se pelas cidades tentando o trabalho mais leve, que a sua fragilidade não lhe permitia a vida dos campos. Menina mimada a tudo isso fora poupada pelos pais, enquanto a irmã única e mais nova tinha que acompanhar no trabalho de campo, no contrabando de que se vivia por aquelas terras.A minha mãe bordava, costurava e mostrava-se na sua beleza e elegância pouco usual às gentes do povo. Tirou a sua 4ª classe com distinção e só não foi estudar porque o povo criticou as ousadias de grandeza dos meus avós. Mas as diferenças de tratamento marcar-lhe-íam toda a sua vida, e, obviamente a minha também.


FELICIDADE ABSOLUTA


Foi em Salvaterra do Extremo então que eu passei a minha primeira infância.
Oh que felicidade! Nos campos era livre, não tinha bibe e a roupa era para sujar. A terra era para mexer , brincar e rebolar-me nela. Lembro-me que quando havia lama fazia bolas e que as atirava sem destino, os riachos refrescavam-me os pés cansados de correr.
Tudo era bom, o cheiro, a luz, o balir das ovelhas – o meu avô era então pastor – o coaxar intermitente das rãs e o ralhar constante da Avó, mulher pequena e beirã sempre ladina e arredia, sempre ralhando como usam as mulheres da Beira. Mas não me incomodava, o ralho não era comigo, eu era a luz dos seus olhos, a sua menina de oiro. Tudo o que eu fazia tinha graça, tudo o que eu dizia era esperteza – hoje revejo o rídiculo nos outros avós e nos outros netos, mas era bom ser amada, era tão bom...

Quando a Mãe vinha era a “ Senhora bonita” que me trazia doces e brinquedos e me pegava ao colo, depois partia e eu ficava outra vez entregue ao sol e à terra e àqueles que nunca íam para longe sem mim.


A VIDA COM MENOS CORES
Castelo Branco,1967 http://arquivo.forum.autohoje.com/uploaded/blitz/200592165741_wCasteloBranco-3.jpg

Um dia a Mãe voltou e fomos todos para Castelo Branco, os Avós a Mãe e eu...e a vida mudou!

Aqui a minha mãe começou a ficar doente e as recordações dessa época são tristes.
Visitas ao hospital, silêncios para não a incomodar, culpas sentidas e incutidas sobre mim, imaginárias talvez, mas dolorosas ainda hoje.

Foi assim até eu ter decidido que não queria mais e sair de casa, aos 18 anos, para casar.

Pelo meio há a morte da avó – sentida como mais um abandono – a juntar aos abandonos de pai e de mãe -, a morte do avô, o excepcional dia 25 de Abril de 1974 ( tinha então 11 anos), que foi óptimo porque não tive aulas o dia todo e porque que a RTP manteve a emissão contínua.

Houve o encontro com os amores adolescentes - sempre proíbidos bem como as amizades - , as idas para casa de familiares aquando dos internamentos da Mãe, e a pouca motivação para os estudos.

A instabilidade que se vivia na Escola não ajudava, as matérias não eram devidamente leccionadas, os professores pouco competentes, as R.G.A.s( Reunião Geral de Alunos) eram diárias, e a minha imensa curiosidade dividia-se pelos livros (que a minha Mãe me proíbia de ler) e pelos namoricos próprios da idade!

E foi assim que abandonei a Escola.

Aos 18 anos casei-me com um colega de escola, aos 19 tive a minha primeira filha – O meu primeiro Grande Amor!
Aos 20 anos nasceu o outro meu grande Amor, a minha 2ª filha, e foi na Maternidade que me senti realizada!Finalmente tive a quem amar da forma como eu queria e precisava, de forma intensa,
completa
e
absolutamente verdadeira.
Entreguei-me de corpo e Alma a esses dois amores e preenchi todos os vazios que tinham ficado no meu coração!

(para continuar...um dia destes)

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